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SamuelDabó

exercícios de escrita de dentro da alma...conhecer a alma...

SamuelDabó

exercícios de escrita de dentro da alma...conhecer a alma...

10
Abr08

PAIXÃO EM ANGRA DO HEROÍSMO . Cont.7

samueldabo

Alberto ficou em estado de choque. Seguia  o policia e ouvia como que vindo de muito longe, a voz que procurava dar-lhe algum conforto. Tinha presente, uma fixação, a imagem de Carla debatendo-se, a angústia nos seus olhos lindos, o terror. E ele, impotente, sem meios de a proteger como prometera e a fizera acreditar.

Pronunciava baixinho o nome de Carla. Lado a lado, o policia esbaforido pela corrida e chegados à esquadra, os telefonemas a alertar as entidades em todos os pontos, a equipa que o queria interrogar. Se vira os raptores. O pormenor do carro, matricula, cor, marca. Algum indicio que pudesse ajudar. Nada.

Deixou a identificação, o hotel onde se hospedava, e saiu como louco. Voltou à baía. Em passos rápidos, tropeçando nas saliências, foi até ao bar e voltou, subindo a rua da Sé até ao alto das covas, desceu na direcção do mar. Ergueu as mãos ao céu . Procurar, encontrar, Carla meu amor. Porquê tu,

Não dormiu e o seu aspecto não ajudava a que lhe dessem a devida atenção. Foi à esquadra ver se havia noticias. Nada. Foi à policia marítima . Nada. Alugou um carro para percorrer a Ilha, junto ao mar. Toda a Ilha.

Alberto encontra Paula, colega e grande amiga de Carla que lhe fora apresentada dias antes.

-Alberto, que tragédia! Carla era a minha melhor amiga. Estudámos juntas e leccionamos na mesma escola. Temos até um mesmo método pessoal de ensino que aprofundamos em conjunto, em que o aluno é o fim único, como pessoa. Eu bem a avisei que o tipo era um mafioso. Não sei o que ela viu nele. Como se deixou envolver.

Alberto estava em outro lugar. As palavras de Paula.  Longe, em surdina. Envoltas de sons desconcertados , mas percebeu mafioso e questionou-se: A que propósito?

-Paula, desculpa, não ouvi tudo o que disseste. Por ventura era importante, mas estou exausto e preciso de algo que me alimente a esperança. Quem é o mafioso?

-O Santiago , o tipo com quem ela casou. Felizmente que por pouco tempo. Para mim foi ele que planeou tudo.

-Paula!...Então temos de dizer isso à policia.

Pegou na mão de Paula e arrastou-a para a esquadra. Informaram os agentes das suas suspeitas para que fizessem diligências. O tipo era de Ponta Delgada.

-O tempo urge, senhor agente. Disse Alberto com exaltação.

Agora foi Paula que pegou na mão dele e o levou a tomar um café. Tentando animá-lo. Chamá-lo à vida. Que quando Carla voltar não vai gostar de o ver assim.

O pensamento de Alberto está em Santiago , que nem sequer conhece . Toca o telemóvel . Alberto olha o visor com esperança. A chamada é privada.

-Está? Alô, quem fala? Está? Está lá?

O silêncio a regurgitar a angústia em espasmos doloridos nas frontes suadas. Os olhos alucinados.

-Quem era? Perguntou Paula.

-Não sei. Não falaram.

O telemóvel volta a tocar. Alberto deixou que tocasse por um momento. Clicou para atender.

-Está lá? Sim, por favor? Está a ouvir-me? Está? Desligaram.

Pensativo, Alberto, enquanto caminhavam sem rumo definido , entraram na nave da Sé. O silêncio de recato religioso. Olhou os Santos  e a imagem de Cristo.

-Meu Deus trazei-ma de volta.

Alberto, num repente, dirigiu-se para a saída  dizendo:

-Já sei! Mariana.

Paula, estupefacta, sem perceber o que se estava a passar, acompanhando-o a custo.

-Que se passa ,Alberto? Quem é Mariana.

-Mariana é a minha ex-mulher. Há precisamente um ano que não sei nada dela. Estes telefonemas só podem ser dela. Era um hábito ardiloso dela para me provocar.

Repetia palavras sem nexo, a procurar conjugar implicações. A conexão entre os mafiosos e a justiça. Um turbilhão de hipóteses. Voltou à policia. Aditou os indícios . E partiu para procurar Carla junto à costa, nas praias, por toda a Ilha.

 

 

Registed by Samuel Dabó

 

09
Abr08

DEIXEM ESMERALDA VIVER

samueldabo

Um homem tem uma relação fortuita com uma mulher. Da relação nasce uma menina. A mãe diz-lhe que ele é o pai. Ele duvida e não assume a paternidade. A menina nasce e a mãe, considerando que não tem condições para a criar, entrega-a, à revelia do direito, para adopção.

A menina tem cinco anos hoje. O pai biológico que entretanto fez testes de paternidades   viu confirmada a génese e quer a menina de volta, contra a opinião de psicólogos, sociólogos , pedopediatras e os pais adoptivos.

O caso é levado aos tribunais. Os juízes não se entendem. Ora ordenam a entrega, ora favorecem compassos de espera. A última página, à porta do tribunal, com a criança a recusar sair do carro e alguém abalizado a instigar o pai adoptivo para que tomasse uma atitude de força contra a criança.

Juízes, advogados, gente a que nos habituámos o devido respeito.

Não há quem pare esta tragédia que se abateu sobre uma criança que não pediu a ninguém para vir?

A declaração universal dos direitos da criança não é suficiente para acabar com este suplicio?

Não será tempo de fazermos ouvir o nosso : Nãããããããããoooooooooo !!!!!!!!!!!!, em uníssono , de Norte a Sul, para que os hipócritas do direito deixem esta criança em paz?

Não basta perguntar à criança. Onde , com quem queres ficar?

Vamos, nós gente que habitamos este país, que pagamos impostos directos e indirectos, permitir que uma criança de cinco anos seja disputada na praça pública, nas salas frias dos tribunais, despojada da sua personalidade, interditada de amar a quem ama e de querer a quem quer?

Estendo-te a minha mão, Esmeralda, temendo que não vá a tempo de a poderes agarrar. E apelo às pessoas, chamadas povo, do meu país, e aos que têm a responsabilidade pelo nosso bem estar, para que termine esta chacina da tua identidade.

 

08
Abr08

E AGORA?

samueldabo

E agora?

Levantas-te pela manhã, à mesma hora. O mesmo ritual. E sais à procura dos dias, dia a dia, a ver o rio, adivinhar o mar ali tão perto e saudar os que, como tu, esquecidos, vagueiam nas ruas ao sol, ao vento, à chuva.

No outro lado da vida, a luta continua encarniçada.

Contar os euros, parecer ser melhor do que o outro, apropriar-se das ideias, comprar, vender, chegar depressa, ganhar, perder, a importância do que dizes, a insignificância dos rivais, os amores, as traições, os objectivos, a ganância, o crime, a fuga aos deveres que nunca aceitamos, a exigência dos direitos.

O teu pensamento está lá, nesse turbilhão excitante que, apesar de tudo, é vida.

Mulher, homem, que nos guardas na memória.

06
Abr08

A VISITA DO FILHO PRÓDIGO

samueldabo

Que bom ver-te, meu menino! E como estás bonito!

Há quanto tempo não te via, os olhos brilhantes e o rosto cheio de carne sadia. O falar fluente, a alegria, o abraço forte, o beijo.

Fico a olhar os teus gestos decididos a desfazer a mala. A arrumar tudo meticulosamente.

Há vinte anos que te não via e só guardava a tua imagem de menino. Lindo, de olhos grandes, castanho escuro, os caracóis em revolta na cabeça de sonhos. E o sorriso.

Voltaste a sorrir, como quando jogávamos à bola na mata em frente, e te fazia perder para ouvir os teus protestos, porque só querias ganhar.

Que bom ver-te meu amor. Sentir que não te levaram de todo. Que ainda resistes e estás mais determinado do que nunca a vencer.

Bem podias  ter vindo mais cedo. A minha mão esteve sempre estendida do lado de fora do mundo em que caíste.  Em frente de ti. E sempre que te via, acenava-te. Gritava o teu nome. Filhoooo !!!...

As novidades? Estamos bem, como vês. Chegou uma menina encantadora que cresce plena de felicidade. A neta, tua sobrinha. O pai está desempregado A mãe, continua batalhadora. Estamos bem, como vês.

Que bom ver-te com a esperança embandeirada. O hino de confiança. A paz que regressou ao teu coração desfeito em rotura com o mundo.

Que bom ver-te, fruto de um grande amor , quando já desesperava de te ver.

Bem vindo a casa e fica, se vieste para ficar. 

 

05
Abr08

PAIXÃO EM ANGRA DO HEROÍSMO . Cont.6

samueldabo

Mariana, jovem advogada, filha única de uma família de classe média, sabia-se possessiva e com desejos inexplicáveis de posse. O que era seu. Partilhar nada. Só o que fosse possível colher quando ela própria se expandia em acessos de verdadeira loucura apaixonada.

Sabia-se bonita e cultivava a aparência , ultrapassando qualquer que fosse o obstáculo, por mais difícil .

Na barra do tribunal, não se coibia de humilhar colegas e arguidos com um sorriso arguto, por vezes sarcástica, senhora que era de influências importantes no meio judicial e da investigação.

Olhos castanhos claros, rasgados num rosto moreno, bem maquilhada, os lábios de um rosa exuberante, cabelos castanhos em revolução, caracóis , farripas ao vento.

Gostava de sessões exaltantes e prolongadas de sexo.

Alguém lhe dissera um dia que era hipersensível , ninfomaníaca ...

Tinha conhecido Alberto nas idas à livraria. A forma apaixonada como ele falava de livros e autores A presença afável, atenciosa, os olhos que a hipnotizavam . O corpo , másculo. Mas sobretudo a voz. O espírito inocente quando lhe dizia que só casava com uma mulher virgem. Quanto muito, semi -virgem. E ela rira-se divertida.

-O que é isso de semi --virgem?

Perguntara maliciosamente, na iminência de o encurralar .

E ele, Alberto, a voz trémula, quente, indiciando vergonha.

-Uma pessoa que não tenha tido relações sexuais há pelo menos doze meses, é, para mim, semi virgem. É como se fora a primeira vez. Pode até ser considerado um fetiche.

E de como ela lhe mentia, porque a entusiasmava mentir-lhe, quando ele falava na teoria do amor absoluto. Amarem-se como um só.

Mariana. A sala vazia. A passar em memória lenta, os curtos meses de casamento com Alberto, que desaparecera.  O empregado da livraria disse que ele fora para a Ilha. Qual Ilha?

Os momentos de grande excitação sexual. Não podia queixar-se. Aí ele cumprira. As discussões quase diárias e ela sem vontade de se esforçar, como ele queria, para alcançarem um traço de união, uma consubstanciação de valores comuns.

E, por fim, esse caso absurdo do irmão dele. Meteu-se na droga? Que se safe. Não era ela que iria manchar a sua reputação, por um caso perdido

Agora trocara-a por uma ilhoa , soubera ontem, e isso não lhe perdoava.

Assinara o divórcio, sem complicar, porque também ela queria sentir-se livre, desimpedida.

Conhecera Santiago, um jovem elegante, físico poderoso, másculo, a respirar sensualidade, num julgamento por tráfico de droga. Conseguira a absolvição graças aos seus argumentos dilatórios e a outros atributos.

Festejaram, no quarto do hotel onde ele se hospedara. Foi uma noite de exaustão a raiar um sadomasoquismo mutuo. Exaltante.

Ficou a saber que Santiago era de S. Miguel, divorciado e que alimentava vingar-se do que ele dizia ser uma traição pós traumática. A ex mulher andava de amores com um tal Alberto do Continente.

Mariana ficou estupefacta. Também ela, agora, com um ilhéu, para si era suficiente, como amor próprio, como vingança.

- Se nós aparecêssemos por lá, ligados, em apoteose.

Santiago olhou-a fixamente, avaliando a recepção dela. O até onde estaria disposta a ir.

-Não, eu tenho um plano que vou pôr em prática quando regressar, mas preciso de apoio jurídico , um apoio interessado, engajado.

E foi descrevendo, com minúcia, como pensava raptá-la, Carla. A ele não importava Alberto. Mas a morte de Carla, uma morte acidental que não o comprometesse, instalara-se na sua mente.

Para Mariana ficou claro que a morte de Carla afectaria profundamente Alberto. Senti-lo a sofrer. Vivo. Visitá-lo na livraria. Fixa-lo  na sua solidão. Provocá-lo.

-Está bem. Dou o meu acordo, isto é, podes contar com a minha colaboração jurídica . Também eu não quero saber dessa vaca para nada, não me aquece nem arrefece a sua morte, mas quanto ao que restar de Alberto, pago para assistir.

E Santiago a explicar o plano, de como tinham cavado uma gruta no Ilhéu das cabras, lugar ermo e frio, a poucos metros da costa, As correntes fortes. O rapto a acontecer em Angra, aproveitando o hábito que eles tinham de se passear à noite, sozinhos , distraídos, confiantes. E  transportá-la para o Ilhéu onde, sem comer e beber, nem os ossos ficarão por vestígio . Os olhos brilhantes com laivos de sangue. Um sorriso malandro nos lábios cerrados, finos, mas belo, no seu conjunto. E voltaram a envolver-se demoníacamente, sedentos de alcançar o inacessivel. Mentes perturbadas.

 

 

04
Abr08

A LUTA DE UM MENINO DE 4 ANOS COM A SUA EDUCADORA

samueldabo

Há dias, num infantário, jardim de infância, na vila onde eu moro, assisti à luta de um menino de 4 anos com a sua educadora.

O menino debatia-se, perante a sua própria impotência, e gritava o mais alto que lho permitiam os seu pulmões ainda viçosos.

-Larga a minha mão! Larga a mão! e chorava.

Indiferente, insensível ao choro, quase o arrastando, a educadora lá ia dizendo.

-Tens que vir! Tens que vir!.

-E o menino, debatendo-se ( não, não vi pontapés), fincando os pés, resistindo.

-Larga a minha mão!

Juro que é verdade. Eu vi!

Não uso telemóvel com câmara. Mas, por um momento pensei chamar a policia e ser testemunha do ataque violenta dum menino à sua educadora. Que pais? Que País. Aonde vamos parar.

Mas não. Pus-me a pensar. É pura coincidência!

04
Abr08

AS PESSOAS ENAMORAM-SE, CASAM, TÊM FILHOS E DEPOIS MORREM

samueldabo

As pessoas enamoram-se. Casam. Têm filhos. E depois morrem.

Ele: estar nos braços descomprometidos da amante. A novidade dos aromas e da conquista. As palavras que levantam a sua auto-estima. Não ouvir diariamente que é um desarrumado, que não faz nada em casa. Levar as crianças. à escola Ir ao hipermercado. O aspecto descuidado, da legitima, quando em casa, a cozinha , a limpeza da casa . O cabelo em desalinho.

O contraste da boa disposição continuada,  da amante. O mistério dos encontros furtivos. Sempre fresca e ataviada para o receber. A descoberta de novos desafios voluptuosos

Ela: O legitimo faz tudo a contragosto. Não dá o devido valor ao esforço que faz para manter a casa arrumada, as roupas lavadas e engomadas. O desleixo nas  finanças familiares. Só quer sexo. Não se importa com o seu cansaço. Desiludiu-a. O amante é carinhoso. Diz-lhe as palavras que ela gosta de ouvir. Enaltece as suas qualidades, o seu valor como mulher e gosta de fazer sexo com ela. Admira o seu corpo jovem. Não vê estrias, nem deformações celuliticas .

Atavia-se quando sai aos encontros furtivos e veste a bata da submissão, quando volta.

Se ousassem reflectir, um no outro, e dizer olhos nos olhos o que dizem aos amantes.

E acreditassem que o amor é uma chama que se alimenta de amor e não de substitutos viciados, desviantes.

Que um homem, uma mulher, não são meras quotas de uma sociedade comercial e cultivassem os valores subjacentes de cada um.

 

 

02
Abr08

PAIXÃO EM ANGRA DO HEROÍSMO . Cont.5

samueldabo

Ao jantar, falaram de factos passados, acidentes escolhidos em momentos de procura. O embuste das palavras, a teatralização  estudada que nos leva a sentir, a acreditar.

Alberto falou da sua relação com Mariana. Da paixão violenta. Era bom fazer sexo com ela e no fim, sentir o bem estar das coisas conseguidas. Não ter reparado em como era possessiva. Apenas fazer sexo com ela. E acorrer a todas as chamadas. Até ao dia em que, confrontados com uma situação difícil , tudo se desmoronou. Era frágil o elo de ligação. O que eu queria era o absoluto, no amor. Conciliar o ser e o haver, numa absorção total das duas mentes, como uma só. Que se digladiam , se confrontam, se violentam, por vezes, como nós em nós, mas que se amam acima de tudo, tudo mesmo. Porque se confiam e esperançam a cada momento de vida, se respiram. Não fingir. Não há seres perfeitos. Saber gostar, amar as imperfeições do outro.

Carla deixara de comer, embevecida, com a ternura das palavras. A mão pousada sobre a mão dele como que a estabelecer um elo. E não se conteve.

- E que situação foi essa? Queres falar sobre isso? Meu amor! Como eu me sinto ir, liar-me no menino triste que ainda há em ti. Como eu te amo!

Alberto estremeceu. Em milésimos de segundo permitiu-se pensar que naquelas palavras não havia teatro. O ar doce de Carla. Os olhos a espelhar lealdade.

-Mulher linda da minha vida. Vamos viver o absoluto do amor! Amo-te tanto. É tal o prazer de estar aqui e ver a tua imagem, desde há dias, a tua imagem. Deslumbrante que me esqueci de te dizer quem sou, o que faço.

Alberto levantou-se da cadeira e deu-lhe um beijo sobre os olhos, quente e húmido e voltou a sentar-se sem deixar de a fitar e ela nele, como serpente e presa cada qual, o ser e o não ser.

-Sou livreiro. O meu pai deixou-me uma loja que vende sonhos. Mariana era jurista, fria, calculista. Sei-o hoje. Eu tenho um irmão que foi arrastado pelo sórdido lado da vida. Drogas pesadas. Roubou. Foi preso. O que eu esperava de Mariana era que o defendesse em tribunal. Que usasse todos os trunfos. Que afrontasse o sistema. Que fosse um eu nela e ela em mim. E ela recusou. Não queria manchar a sua reputação. Podia entregar o caso a um colega. Foi o fim. Acabei de deitar o que quer que restasse.

Nos olhos de Carla a luz, sem lamechas. Um sorriso doce de esperança. O belo e diáfano som da sua voz.

-E salvaste-o?

-Sim, está num centro de recuperação . Há já um ano.

Pagaram, levantaram-se e seguiram enlaçados, os corpos embatendo-se a cada passada,

um último olhar à Lua e ao reflexo sobre as águas calmas da baía, beijando-se, arrulhando e sentindo-se, como um só, o pulsar apreçado do coração.

Subiam a rua da Sé envoltos no quase silêncio pelo adiantar da hora. E Alberto, ao ouvido, num sussurro.

-Não tens medo?

-Oh! Não. isto não é Lisboa. É uma cidade pacata. Nunca acontece nada. E agora tenho-te, querido, para me proteger .

A noite a refrescar e uma ténue neblina a emprestar um ar soturno aos candeeiros de luz mortiça, emblemática duma cidade quase museu.

Alberto olhou em volta, a rua deserta. Vindos da Praça velha, dois carros em andamento lento. De cima nada.

Um dos carros parou, no preciso momento em que Carla mudou de posição e se colocou do lado esquerdo de Alberto. Da janela entretanto aberta, uma mão forte arrancou a mala de mão de Carla e arrancou na direcção das Covas.

Alberto, num impulso, deus alguns passos em perseguição do carro que, um pouco à frente, deitou pela mesma janela a mala , a mesma mala.

 Apanhou-a e voltou-se, com um ar triunfante, mas?...Nada. O vulto de Carla, debatendo-se, os olhos de pânico, no interior do outro carro que seguiu a alta velocidade, o chiar dos pneus na pedra polida da rua da Sé. O ar desesperado de Alberto, sem compreender, sem aceitar, sem querer acreditar, olhando ainda em volta, no espaço interior  do recanto exterior   da loja.

Tinha visto um policia junto à Caixa, correu em desvario. O policia também tinha seguido o desenlace do rapto.  Vinha a subir na direcção de Alberto. Tirou as matriculas porque lhe tinham parecido suspeitos. Iria tratar de tudo, fechar portos de saída. Aeroporto. Que tivesse calma. é uma questão de tempo. Estamos numa ilha.

continua

 

 

Registed by : Samuel Dabó /P>

 

 

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